sexta-feira, 10 de novembro de 2017

A história do homem que só consegue usar roupas femininas

Essa é a história de Marcelo de Oliveira, uma história emocionante e cheia de sofrimento.
Foi transcrita exatamente como ela é sem alterar dado algum. confira na íntegra:
“Mataram meu pai quando eu tinha nove anos. Eu era o caçula de seis filhos, o único homem. Minha mãe, sem dinheiro nenhum, passou a me vestir com a roupa das minhas irmãs.”
“Você é gay?”
“Não, sempre adorei mulher. Tenho dois filhos, fui casado duas vezes, tenho namorada. Já fiz tratamento com psiquiatra, mas não adianta: se me visto como homem, me deprimo demais.”
“Já tentou usar roupas de homem?”
“Quando eu tinha 13 anos, minha mãe se casou de novo e pôde me comprar roupas masculinas. Eu chorava muito, nem comia. Pegava calcinha, sutiã, vestido das minhas irmãs, levava tudo para o mato e vestia escondido. Apanhei muito da mãe por isso.”
“O preconceito é grande?”
“Quase morri uma vez. Me quebraram duas pernas, um braço, quatro costelas e o osso do queixo. O povo me xinga de bicha, de travesti, de tudo que é coisa. Quando chego em casa, me dá uma tristeza… Eu nem saio à noite, não vou a bar nenhum.”
“Você faz o quê?”
“Sou tratorista, trabalho na terra. Uso calça e camisa no serviço, mas por baixo visto calcinha e sutiã. Sou feliz usando roupa de mulher, mas seria muito melhor se me aceitassem.”
“Preciso perguntar sobre a Copa…”
“Não gosto de jogar bola, não gosto de time nenhum, nunca gostei de futebol. Mas Copa do Mundo é diferente: vou torcer porque, para o meu país, eu torço sempre.”
Marcelo de Oliveira, em Sabino (SP)
**Entrevista que realizei há exatos dois anos – e que o Facebook me lembrou hoje – durante o projeto Na Beira da Copa. Nossa expedição cruzou o país para mostrar como o Brasil distante das cidades-sede se preparava para o Mundial. A cada resposta do Marcelo, meu peito se comprimia. Não há repórter blindado a isso.
Foto: Lauro Alves
Fonte: Na Beira da Copa

sexta-feira, 3 de novembro de 2017

Outro nome para outro sexo

A troca de nome pode ser a última etapa de uma longa jornada.

Você já ouviu falar em “transgênero”? E “crossdressing”? Ou talvez a primeira palavra remeta a algum tipo de pesquisa genética e a segunda a uma nova modalidade de carteira de investimento. Será?

O fato é que transgênero é uma palavra pouco conhecida, falada ou discutida. Mas nem tão difícil de decifrar. Gênero, sabemos, refere-se a duas polaridades: masculino e feminino. O “trans” na frente significa transição ou algo como “além de”, “através de”. Você pensou em travesti. Sim, o travesti é um dos grupos entre os muitos que a palavra transgênero engloba. Mas não só.

O crossdressing denomina a prática de outro grupo também pertencente ao que se pode chamar de transgênero. Esse grupo de pessoas se veste com roupas do sexo oposto, independentemente da orientação sexual seguir ou não essa tendência. Ou seja, numa definição simplista, podemos dizer: um homem – pode ser hetero ou homossexual – que se veste de mulher com frequência, e que faz disso um prazer e/ou um hábito, é um crossdresser.

E isso não é ser travesti? Não necessariamente.

Deu nó? Calma!

Pode-se afirmar que, atualmente, no Brasil, um crossdresser é pessoa bem informada, provavelmente de classe média ou alta, que se dá o direito de realizar essa transição entre gêneros. Quem já se transformou em ícone dessa espécie de movimento é o festejado cartunista Laerte Coutinho, autor de tirinhas como a “Piratas do Tietê” e com profícua trajetória artística. De uns tempos para cá, aos poucos, foi aparecendo publicamente trajando roupas e acessórios femininos. Hoje em dia e aos 60 anos, Laerte assumiu integralmente a sua condição de homem com identidade de gênero feminina. Nas entrevistas que concede à imprensa, ele afirma considerar que sua nova escolha se relaciona a um processo “autoexploratório”, de autoconhecimento, que pode também estar vinculada à dor de ter perdido um de seus filhos em um acidente de carro; momento em que – ele diz – “caíram todos os véus”.

Laerte ainda está “em processo”, mas ao apresentar-se socialmente como mulher, ao declarar que está se deparando com sua bissexualidade e aceitando-a, ou seja, ao tornar-se um crossdresser, ele se aproximou do universo de uma minoria bastante estigmatizada, e sem o mesmo poder de argumentação, articulação e atitude dos crossdressers: os travestis. Estes, em sua maioria, trazem na história de suas vidas episódios de abandono, violência, rejeição e prostituição.

Quando o tabu da virgindade era fortemente enraizado na sociedade brasileira – o que ainda é possível de se constatar nos rincões por esse Brasil afora –, uma menina que era “deflorada” fora do casamento ficava marcada para sempre. Era enviada a um parente distante, a um convento – passando-se por virgem – ou, destino tão cruel quanto os demais, era expulsa de casa. Muitas se tornavam prostitutas. Parece medieval, não? Pois é mais ou menos isso o que ainda acontece aos travestis. Em muitos casos, a inadequação sexual é marcada fisicamente por atrofia nos órgãos genitais. Pouca informação e muito preconceito cravam o destino dessas pessoas ainda na pré-adolescência.

Não é preciso, entretanto, se vestir com roupas do sexo oposto para tentar imaginar as demandas dessa minoria. Em 2008, a portaria nº 1.707 do Ministério da Saúde atendeu a uma dessas demandas ao instituir a realização do processo transexualizador, também conhecido como cirurgia de adequação do sexo ou redesignação sexual, no SUS – Sistema Único de Saúde. A cirurgia é como uma etapa final de um longo processo que envolve questões psicológicas e psicossociais, avaliadas e acompanhadas por psicólogos.

Aos que optam pela cirurgia e desejam a completude na identidade de gênero, ainda há outra etapa a concluir, também nada fácil: o processo legal para mudança do nome e do gênero nos documentos. Ora, uma vez que se tenha mudado de sexo, o nome – masculino ou feminino – já não corresponde à real personalidade de quem o carrega. Em respeito à sua identidade e a terceiros, a modificação de nome é um direito e um dever.

No Brasil, o caso que ganhou a mídia foi o da modelo Roberta Close. Operada em 1989, na Inglaterra, foram necessários 15 anos para que tivesse o direito à mudança de nome, de Luís Roberto Gambine Moreira para Roberta Gambine Moreira, e que pudesse colocar “feminino” no item “sexo”.

No Rio Grande do Sul, estado que se mantém na vanguarda quanto às questões de direitos de cidadania das minorias, recentemente, foi instituída a “carteira de nome social”, por meio da Secretaria de Segurança Pública, com o objetivo de garantir a identidade de gênero. Nela, travestis e transexuais utilizam o nome que pretendem usar após a efetivação do processo de adequação sexual. Essa carteira vale como documento nos postos de saúde e em demais serviços públicos estaduais.

Parece bonito viver em uma sociedade que se autodenomina “plural”. A construção dessa pluralidade depende do Estado, que tem o dever de resguardar os direitos e a dignidade de todos os cidadãos. Mas passa também por cada cidadão que vê, nos modos de vida e nas escolhas diferentes da sua, apenas isso: uma diferença.

A lingerie é dele – crossdressing



Muita coisa mudou no quesito vestimenta nas últimas décadas. Hoje mulheres podem usar muitas roupas antes designadas apenas aos homens sem ter grandes problemas com isso. O inverso é verdadeiro? Não muito. Menos ainda quando se trata delingeries femininas sendo usadas por homens. Torceu o nariz ao ler isso? Pois saiba que isso não só acontece, como é mais comum do que se imagina. E não se trata de orientação sexual ou identidade de gênero. É o “crossdressing”.

Na Austrália uma empresa especializada em “lingeries elegantes” para homens está tendo que expandir seus negócios online para poder atender a demanda cada vez maior em busca dessas peças intimas “diferenciadas”.


Chamada “HommeMystere”, a marca oferece peças com rendas e seda e calcinhas tipo tanguinha. Foi criada em 2008, quando Brent e Lara Krause perceberam que havia pouquíssimas opções para homens com esse fetiche. Além disso, até então os caras tinham que comprar suas peças em lojas de mulher, mas agora eles já sabem exatamente a onde ir, além de encontrarem peças com design “feminino”, mas feito para se adaptar ao corpo masculino. Hoje a empresa já entrega em mais de 30 países, incluindo Rússia, Canada e América – que responde por 40% das vendas da marca.
Nas imagens de divulgação da marca aparece um homem ao lado de uma mulher, o que pode confundir muita gente, que assume logo de cara que um homem que compra lingerie feminina é gay. Errado. Um questionário aplicado aos clientes da HommeMystere revelou que 90% dos clientes estavam em uma relação heterossexual. “Não nos importamos se você é gay, hétero, vegetariano, republicano, anglicano, marciano ou qualquer tipo de convicção. Nós só queremos desenhar e fabricar lingeries atrativas e de luxo para homens”, explicou Mr. Krause.
Ele, aliás, é um adepto da prática e conta em seu blog sobre a culpa que muitos homens sentem por terem escolhido usar lingerie, e espera que sua empresa continue lutando contra estereótipos sobre o que os homens podem ou não podem usar.
Pode parecer confuso, e é um pouco mesmo, mas crossdressing é diferente de transexualidade e drag queens. Segundo um material sobre identidade de gênero elaborado por Jaqueline Gomes de Jesus, doutora em Psicologia pela Universidade de Brasília, enquanto a transexualidade é uma questão de identidade – o transexual se identifica como do sexo oposto ao dele – o crossdresser sente-se como pertencente ao gênero que lhes foi atribuído ao nascimento, mas frequentemente se veste, usa acessórios ou se maquia de maneira diferente daquela socialmente estabelecida para o seu gênero, sem se identificar como travesti ou transexual. Já os transformistas ou drag queens são artistas que se vestem, de maneira estereotipada, conforme o gênero masculino ou feminino, para fins artísticos, apresentações etc. Nenhuma dessas definições, no entanto, define orientação sexual. Nem toda mulher transexual vai se relacionar sexualmente com homens, nem todo crossdresser é gay (a maioria dos crossdressers, aliás, é homem hétero) e assim por diante.
Via: http://juliapetit.com.br/moda/aumenta-busca-de-lingeries-masculinas-pratica-e-conhecida-como-cross-dressing